Conclusões do Fórum do Património 2019

Os cidadãos são os beneficiários por excelência do património cultural, e, ao mesmo tempo, os agentes potencialmente mais poderosos da sua salvaguarda. No entanto, a ação dos cidadãos em prol da conservação do património cultural, mesmo ao nível estritamente local, dificilmente surtirá efeito se não for exercida coletivamente, através do associativismo.

A ação das associações, enquanto facilitadoras da apropriação do património por parte das comunidades, terá, por seu turno, de ser articulada com a de outros agentes, dentre os quais se destacam imediatamente as autarquias. As associações de defesa do património e as autarquias completam-se mutuamente quando o objetivo é por de pé projetos de salvaguarda e valorização do património cultural: as primeiras possuem o conhecimento tradicional e a ligação às comunidades locais, as segundas detêm os necessários recursos organizacionais e financeiros. As universidades e politécnicos, detentores do conhecimento científico e tecnológico, e os meios de comunicação social, capazes veicular para o grande público a ação dos movimentos associativos, são os outros dois atores essenciais da cidadania do património cultural. 

Para que a participação pública seja efetiva, os cidadãos e as suas associações não devem ser ouvidos apenas nos períodos para tal previstos na Lei, antes deverão poder acompanhar o processo decisório ao longo de todo o seu desenvolvimento, logo desde a sua génese, sobretudo quando está em causa o património cultural. Importa também que tal participação seja responsável, esclarecida e, sempre que possível, colaborante.  

Uma ainda grande indefinição relativamente ao diploma da descentralização é a principal conclusão da discussão sobre este tema. Indefinição nas formas, mas sobretudo indefinição nos meios alocados à transferência de competências na área do património para as autarquias. Não sendo um processo essencialmente negativo ou redutor para o património cultural, uma vez que vem formalizar o que, em alguns casos já é uma prática, a transferência de competências no domínio do património cultural para as autarquias deve vir acompanhada de meios técnicos e financeiros para uma correta operacionalização.

A questão principal reside, porém, numa indefinição relativamente a um quadro estratégico nacional, não estando claro de que forma os diplomas apresentados respeitam a uma estratégia portuguesa para o património cultural, correndo o risco da descentralização recentemente iniciada se resumir a um quadro de ações práticas, que vem esvaziar a existência de uma política nacional para o património cultural.
A questão do turismo associada às práticas patrimoniais merece especial atenção pelas estratégias excessivamente mercantilistas.

Face ao desconhecimento das capacidades técnicas, humanas e financeiras dos municípios para executar a política de salvaguarda do património, a sociedade civil é chamada a uma ação ainda mais vigilante, mas sobretudo é interpelada a uma integração nas políticas e estratégias, conformando o que se entende por gestão colaborativa e participativa.

As associações ligadas à preservação, divulgação e valorização do património cultural, assim como as instituições da sociedade civil com as mesmas finalidades, podem ter um papel ativo que supere os seus contextos de ação e devem trabalhar de forma concertada, entre si e com outras instituições.

Capacitar as ONG, os seus profissionais e voluntários, são questões prementes e desafiantes dada a especialização do mundo atual. As parcerias, nomeadamente, entre as diferentes associações e instituições da sociedade civil e entre estas e os estabelecimentos de ensino e formação, centros investigação, institutos de emprego, entre outros, podem potenciar a sua ação, e o seu respetivo impacto, promover a qualidade técnica dos serviços que podem prestar, qualificar a gestão associativa e ajudar a estabelecer uma voz destas instituições comum que possibilite a negociação em diferentes contextos e temáticas.   


Dada a maior exigência da reabilitação do edificado antigo e do património cultural construído, torna-se necessário que os agentes envolvidos, quer ao nível do projeto e da fiscalização, quer ao nível da execução das obras, cumpram requisitos complementares de qualificação. Tais requisitos devem basear-se sobretudo na presença nos efetivos das empresas, desde os operários aos quadros superiores, de recursos humanos adequadamente qualificados, nomeadamente em áreas como as construções antigas e a conservação e restauro, recomendando-se para os quadros superiores, a criação de especializações em Conservação e Reabilitação do Património.

Constata-se, portanto, a necessidade de rever o regime de acesso e permanência na atividade da construção civil e obras públicas e criar regimes equivalentes para as atividades de projeto e fiscalização, ou recorrer a outras soluções que permitam assegurar a adequada capacidade técnica dos agentes, dentre as quais se destacam os sistemas de qualificação.

Devido ao atual clima de facilitismo no setor da construção e ao estigma das profissões da construção, em particular ao nível dos operários e quadros intermédios, existem graves carências de pessoal qualificado a estes níveis e, ao mesmo tempo, um subaproveitamento da oferta formativa e da respetiva estrutura, quer por parte das empresas do setor quer por parte da população jovem.

Para além de serem essenciais para a qualidade intervenções, as medidas acima preconizadas contribuirão para a dignificação e empregabilidade das profissões envolvidas e para o reforço, nos setores em apreço, dos efetivos de mão-de-obra qualificada.