Curutelo: Quando a Hotelaria ganha e o Património perde
Situado em ambiente idílico, perto da localidade de Freixo, concelho de Ponte Lima, o Paço de Curutelo era um exemplar emblemático de morada senhorial medieval e quinhentista do Entre Douro e Minho. O conjunto edificado desenvolveu-se à volta de uma torre ou casa-forte de origem românica, No início do século XIV a torre foi substancialmente reconfigurada, e engrandecida no século XVI, pelos duques de Bragança, com um corpo residencial.
A classificação do Paço como Imóvel de Interesse Público (Decreto nº 129/77, DR, 1.ª série, n.º 226 de 29 setembro 1977), incluía as infraestruras agrícolas, com origem entre os séculos XVI e XVIII, dada a sua importância histórico-arquitectónica.
Apesar das limitações impostas pela Lei 107/2001, de 08/09, nomeadamente nos artigos 40º (Impacte de grandes projetos e obras), 44º (Defesa da qualidade ambiental e paisagística) 45º (Projetos, obras e intervenções), 46º (Obras de conservação obrigatória), 47º (Embargos e medidas provisórias), 49º (Demolição), 52º (Contexto), 53º (Planos) e 54º (Projetos, obras e intervenções), o empreendimento "Vila Galé Paço de Curutelo" foi licenciado pela Câmara Municipal de Ponte de Lima, com pareceres favoráveis da tutela do Património, do Turismo de Portugal e da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Norte!
Inaugurado em 2025, o empreendimento Vila Galé Collection Paço do Curutelo, é um projeto de enoturismo resultante de uma parceria entre os grupos Vila Galé e AP Hotels & Resorts. Dispõe de piscinas exteriores para adultos e crianças, spa, salão de eventos para casamentos e reuniões, bar, dois restaurantes, biblioteca e um espaço museológico dedicado à história do local, além de adega e vinha.
Em resultado dos grandes investimentos no turismo, a última década tem vindo a assistir à multiplicação de intervenções em edifícios e conjuntos classificados, tendo em vista quer proporcionar a "experiência" desses locais a um maior número de turistas, quer a instalação nesses locais de novas unidades da área da hotelaria. Tais objetivos obrigam a realizar obras de adaptação, que têm como limite a salvaguarda do valor cultural desses edifícios e locais, respeitando o seu caráter e integridade.
Para além da legislação portuguesa, os limites a respeitar pelas intervenções no Património Arquitetónico encontram-se, de há muito, divulgados internacionalmente, por exemplo, na CARTA DE VENEZA, de 1964 e na CONVENÇÃO-QUADRO DO CONSELHO DA EUROPA RELATIVA AO VALOR DO PATRIMÓNIO CULTURAL PARA A SOCIEDADE, FARO 2005.
A adaptação do agregado constituído pelo Curutelo a mais uma unidade hoteleira ultrapassou claramente os limites, quer os estabelecidos pela legislação nacional, quer os internacionalmente reconhecidos: Envolveu demolições excessivas, substituição de construções tradicionais por outras em materiais modernos, alteração profunda da volumetria do conjunto, com a consequente adulteração da envolvente do monumento e artificialização da paisagem.

