Praça das Flores, Lisboa: Não à "nova arquitetura" em bairros históricos da cidade!

15-05-2020

Encontra-se atualmente em curso no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a ação popular intentada por três associações subscritoras do Fórum do Património para declaração judicial da nulidade do ato de licenciamento em causa por ofensa ao PDM de Lisboa.

O processo que agora se aproxima do seu termo remonta a setembro de 2015, quando a Câmara Municipal de Lisboa aprovou o projeto de um edifício novo, totalmente dissonante, que, a ser construído, iria perturbar profundamente o equilíbrio do conjunto urbanístico que compõe a Praça das Flores, transformando-a num simples cenário para a celebração duma pretensa "liberdade criativa". Percorreu uma longa "via dolorosa", que passou por denúncias na imprensa, petições públicas e queixas ao provedor de justiça, ao ministério público e à ordem dos arquitetos.

Mas foi a partir de março de 2017, com a interposição da providência cautelar pelas três associações de defesa do Património Cultural Construído (PCC), a Associação Portuguesa de Casas Antigas (APCA), a Associação Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Proteção do Património (APRUPP) e o Grémio do Património (GECoRPA), juntamente com os moradores, que se enveredou por um caminho passível de eficácia, que agora entra na sua etapa final.

A etapa anterior foi a publicação do acórdão de 5 de abril de 2019, com o qual o Supremo Tribunal Administrativo (STA) deu razão às associações de defesa do Património na sequência do recurso interposto pela Câmara Municipal de Lisboa e pelo promotor imobiliário Green Parrot no âmbito do projeto de construção dum edifício dissonante na Praça das Flores, em Lisboa. Nesse acórdão, aquele tribunal de última instância confirma o acórdão do TCA Sul, por entender que a providência foi decretada não só para evitar a demolição do edifício pré-existente, como estava a ser alegado pelos ditos recorrentes, mas para impedir a construção do edifício projetado.

A importância da decisão pelo STA é tanto maior quanto é certo que não deixará de fazer jurisprudência, isto é, de passar a poder ser invocada em casos semelhantes por outras associações e outros moradores, que ocorram noutros pontos do centro e bairros históricos de Lisboa ou doutras cidades do nosso País.

As associações esperam agora que, na ação principal, atendendo a este acórdão e às várias violações do Regulamento do Plano Diretor Municipal, o ato de licenciamento venha a ser considerado nulo e de nenhum efeito, impedindo a construção do edifício tal como projetado.

Recorde-se que o projeto proposto, aprovado contra o parecer dos técnicos municipais chamados a pronunciarem-se, consistia num edifício com cinco pisos, previa vidro a toda a largura da fachada, assente numa estrutura de betão armado revestida com perfis de ferro, lâminas de alumínio para ensombramento e telas de rolo.

A ação desencadeada pela APCA, APRUPP e GECoRPA em março de 2017 integra-se na estratégia que está a ser posta em prática pelo Fórum do Património de, sempre que necessário, invocar, através das mais de quarenta ONG do Património nele agregadas, os instrumentos legais e regulamentares aplicáveis e exigir o seu cumprimento, contribuindo, desse modo, para a salvaguarda do PCC, em linha com a Declaração Final do encontro realizado abril de 2017 na Sociedade de Geografia de Lisboa.

Embora a postura adotada seja preferencialmente colaborante, quer junto dos promotores, quer junto das diversas entidades que possuem competências sobre o PCC, procurando contribuir para a qualidade dos empreendimentos em causa, as ONG agregadas no Fórum propõem-se exigir o cumprimento da Lei nas operações urbanísticas que envolvam o PCC, nomeadamente, a adoção dos princípios consignados nas Leis de Bases do Património Cultural e da Política Pública de Solos, do Regime Jurídico da Reabilitação Urbana, bem como das medidas de valorização e proteção constantes dos Planos Municipais de Ordenamento do Território e dos Planos de Salvaguarda em vigor.

O caso da Praça das Flores é um mau exemplo ao nível do projeto de reabilitação urbana, mas é um bom exemplo do que as associações podem conseguir, se planearem criteriosamente as suas iniciativas e as executarem de forma coordenada, sem esquecer que o mais importante não é bloquear as operações urbanísticas mas sim contribuir para que elas permitam atribuir novos usos ao Património Cultural Construído sem prejudicar o seu valor enquanto tal.